Quando me deparei com este título, achei impossível não comprar o livro. E seu subtítulo foi magicamente inspirador, visto que é um terreno bem pouco explorado, e que merecia uma obra à altura para contar a trajetória da mais peculiar e revolucionária característica humana. E como vocês podem ver, eu não hesitei um só momento.
Antes de começar a folhear a obra, pensei comigo mesmo como se poderia escrever uma história da escrita. Me lembrei de minhas aulas na escola, a respeito da escrita cuneiforme e dos primeiros textos publicados. Imaginava que voltaria a pincelar esse assunto na forma de uma leitura meio nostálgica nesta obra, o que também me deixou receoso de estar encarando somente mais um livro de história. Nunca fiquei tão feliz por estar errado.
A maneira pela qual Martin Puchner decidiu conduzir seu texto foi bem peculiar, e eu sou grato por isso. Para mostrar os efeitos da escrita e seu impacto sobre pessoas e civilizações, ele optou por mostrar como a escrita influenciou os homens que influenciaram a história. E ele começa a jornada com o todo poderoso Alexandre, o Grande. Este homem notável que desenhou a história ocidental tinha sido profundamente influenciado pelo texto da Ilíada, e utilizava a história homérica como uma grande inspiração e um repositório de valores. É quase magnético percorrer os trechos do livro que destacam essa história fascinante. E isso é só um exemplo, apenas.
Posso destacar que a primeira metade do livro é fascinante. A importância do texto escrito é destacada para quase todas as civilizações, ora como motor de reformas religiosas, como a Bíblia Sagrada, ora como repositório sagrado de leis. A forma como o papiro era considerado tão valioso quanto seu conteúdo dava uma magia ainda maior para textos sagrados. E ele não para no Ocidente. A maneira pela qual ele aborda as diferenças de valores dadas para ensinamentos passados oralmente daqueles que seriam "maculados" pela escrita é muito agradável de ler.
Um destaque muito relevante da obra é dada para a revolução provocada pela imprensa. A invenção de Gutemberg transformou o mundo de uma maneira que ainda pouco compreendemos. A popularização do texto escrito com produção massificada de textos e redução de custos levou ao fim um dos maiores privilégios só compartilhados pela realeza e autoridades religiosas: a alfabetização. Confesso que fiquei boquiaberto por nunca antes ter pensado como a privação coletiva do direito à leitura foi tão perversamente explorada pelos poderosos, durante centenas de anos.
Agora, chegamos a parte onde o
livro perde seu fôlego. Depois de perambular pela escrita maia, as aventuras de
Dom Quixote e da importância do Manifesto Comunista, caímos em uma jornada
pessoal do autor. O caráter do livro se desvia um pouco de sua abordagem
histórica e se transforma simplesmente em um relato de uma jornada pessoal de
Puchner, no esforço de identificar as paisagens e o autor de uma certa obra.
Confesso que essa mudança abrupta me frustrou um pouco. Talvez porque eu não
seja um profundo conhecedor de literatura, mas considerando-se que é uma obra
que a princípio deveria ser entendida pela maioria das pessoas, nessa parte ele
deixou a desejar. Mesmo quando ele parece retomar sua escrita empolgante com sua experiência encarando o fenômeno Harry Potter, não se tem muito mais pique. O livro termina bem menos empolgante do que seu
começo promissor.
Publicado pela Companhia das Letras, o volume de pouco mais de 400 páginas flui muito bem na sua maior parte, mas exige esforço na sua segunda metade. Mas não posso deixar de reconhecer que o livro cumpriu seu papel ao dar novas perspectivas sobre o fabuloso fenômeno da escrita. Folhas amareladas e foscas são confortáveis para ler em qualquer ambiente. O livro tem um tamanho bom para levar em bolsa ou até mesmo nas mãos, e é convidativo para uma tarde tomando café numa varanda.