sexta-feira, 22 de novembro de 2019

A Mente Assombrada


Qual a primeira coisa que viria à sua mente se lesse este título em um livro? Confesso que logo de cara, eu pensaria num livro de ficção ou de terror. Aí seus olhos caem no autor da obra, e sua visão muda completamente de direção. Aliás, títulos inusitados e bem diferentes para livros que abordam condições incomuns parecem ser uma especialidade do renomado médico inglês Oliver Sacks.

Se você não conhece este nome, pare agora mesmo a leitura deste texto, abra uma nova aba no seu navegador e acesse a Wikipédia. O autor do livro O Homem que Confundiu sua Mulher com um Chapéu e outra obra que inspirou o filme Tempo de Despertar, protagonizado pelos gigantes do cinema, Robin Williams e Robert de Niro (que ganhou um bem merecido oscar por sua atuação) não merece menos do que isto. Pronto. Agora que você já sabe quem é Oliver Sacks, vamos retornar para seu curioso volume.

Oliver Sacks se notabilizou por chamar a atenção pública em suas obras para condições médicas pouco comuns, numa narrativa que quase beira à romantização. Com uma caneta leve e flexível, ele envolve o leitor nas suas palavras bem escolhidas, e passeia com suavidade diante de situações que poderiam ser consideradas bem desconfortáveis. E aqui ele vai nos oferecer uma boa dose de suas próprias experiências no pouco explorado terreno das alucinações.

Eu confesso que sempre tive uma parcela de curiosidade sobre o tema. Eu já tive alucinações quando estava doente e febril, mas nenhuma delas se fixou muito ou de forma tão detalhada em minha mente. Na leitura de Sacks, comecei a entender que o processo alucinatório não é um evento típico de estados alterados de consciência, ou impulsionados por doenças ou condições fisiologicamente estressantes. E sua narrativa é rica em explorar este vasto mundo do "enxergar o que não existe".

Desde alucinações por psicotrópicos até danos cerebrais que afetam nossa percepção visual do mundo, o autor nos presenteia com um verdadeiro caleidoscópio de experiências diferentes. Pessoas completamente normais, alucinando formas indistinguíveis da realidade, ou enxergando miniaturas detalhadíssimas de prédios e obras de arte, em locais completamente absurdos. O mundo das alucinações é apresentado com uma riqueza de detalhes e de certa beleza, se podemos chamar assim. É de impressionar que muitas alucinações podem ser comportar como verdadeiros fantasmas independentes, demonstrando inteligência e chegando a travar diálogos com seus alucinados. Objetos, fenômenos atmosféricos, criações disformes e monstruosas fazem parte de um leque incrivelmente amplo de imagens que podem ser geradas pela nossa mente. E o autor procura nos apresentar suas causas e possíveis tratamentos. E na escrita fácil de Sacks, a história se desenrola com bastante conforto.

Publicado pela Companhia das Letras, o livro fino não denuncia suas quase trezentas páginas, em tipografia elegante para folhas amareladas e foscas. Uma excelente companhia para bancos de praça, filas de espera ou mesmo uma calma tarde no final de semana. Poucas vezes relaxar com uma leitura pode ser uma coisa tão esclarecedora a respeito das sutilezas de nossa mente. 

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