domingo, 27 de outubro de 2019

A Grande História da Evolução - na trilha de nossos ancestrais



Existem motivos que me levam a olhar de soslaio um livro cuja capa estampa de forma tão destacada a palavra quase mítica Evolução. Hoje, acumulo uma desconfiança adicional com qualquer coisa que procure evidenciar o termo quântico em se tratando de livros ou artigos de forma geral. Um receio natural, que chega a ser quase instintivo, já que vivemos em um mar de informação não filtrada, onde simples opiniões praticamente se forçam a conviver com evidências científicas como se estivessem em pé de igualdade. Mas voltando ao livro, a palavra Evolução se sobressai justamente em uma capa de coloração vermelha viva, quase penetrante. Mas vamos com calma. Dê mais alguns instantes ao seu cérebro, ele precisa processar aquele detalhe amarelado abaixo do título, que faz questão de se mostrar contrastando com a capa "sopa de tomate". Quando você lê o nome, leva segundos para você relaxar, se tranquilizar e pegar o livro em mãos.

Este é com certeza o livro mais volumoso publicado por Richard Dawkins. E desafiador, diga-se de passagem. Um convite de mais de setecentas páginas para seguir nos textos bem elaborados e elegantes de um dos maiores evolucionistas de nossa época. Depois de dezenas de obras dedicadas ao tão incompreendido e fascinante processo evolutivo, o autor provavelmente se viu impulsionado a propor com suas próprias palavras uma obra que pudesse fazer jus à beleza e profundidade que é a história e evolução das espécies. Penso algumas vezes que ele deve ter parado em um determinado momento e refletido sobre o extenso conteúdo de dezenas de livros-texto de ciências biológicas, e como seria interessante que aquelas informações organizadas de forma sistemática e tediosa, usadas para guiar os estudos de alunos de graduação, pudessem ser transformadas em um texto suave e corrido, com um alcance maior do que a restrita comunidade discente acadêmica. Será que esta história tão fascinante poderia ser contada de forma melhor?

Pois bem, ela pode. E foi o que Dawkins conseguiu fazer. Claro que seu extenso livro não é um curso de zoologia ou coisa parecida. Mas sim um passeio conduzido por um cicerone que conhece os melhores pontos para contar a história. Preciso aqui destacar duas características que tornam a obra única. A primeira é que ele convida o leitor a se aproximar das histórias através do que ele chama de "contos", que são as separações dentro da narrativa do texto, onde ele mantém o leitor atento à uma mistura de explicações, experiências pessoais, descrição de experimentos, todas circulando no entorno dos protagonistas dos contos. Essencialmente, não faz muita diferença, mas não deixa de ser uma forma original de trabalhar o texto.

O segundo é uma proposta ousada e realmente diferente. Dawkins decide contar sua história de trás pra frente. Isso mesmo. Ele começa falando das espécies mais derivadas (neste caso, os hominídeos) e vai caminhando, descendo degrau após degrau, visitando os outros organismos partindo do mais complexo para o mais simples. Nossa história da evolução começa, se podemos dizer assim, de forma invertida. A princípio você não sabe muito bem se vai dar certo, e decide confiar no autor nesta jornada inusitada. É no mínimo divertido ler sobre a evolução dos organismos partindo dos homens, passeando pela diversidade até culminar nos organismos unicelulares. E no lápis de Dawkins, vale muito a pena.

Com uma narrativa divertida, recheada de histórias (algumas engraçadas), rica em fatos e informações que vasculham pela genética, diversidade e química, seu livro com certeza mantém o padrão do que se espera de sua autoria. Publicada pela Companhia das Letras, com folhas amareladas e foscas e tipografia elegante, ainda contém no seu interior alguns encartes coloridos. E não esqueça das referências. Você vai gostar bastante deste volume.

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